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Paradoxo: Capítulo 05

As luzes quentes do escritório da editora lançavam um brilho suave sobre os corredores, e, naquela tarde, o som das teclas dos computadores preenchia o ambiente, mesclado com conversas esparsas entre os funcionários. Júlia estava imersa em uma análise detalhada de um novo projeto, tentando manter o foco, mas sua mente insistia em vagar até os eventos dos últimos dias.

Algo estava diferente. Ela e Lucas haviam encontrado um ritmo de trabalho mais harmonioso, quase fluido, e isso a intrigava. Ela ainda o via como uma ameaça à sua carreira, mas, de alguma forma, começava a enxergar qualidades nele que não havia considerado antes. E essa percepção a desconcertava.

O toque discreto na porta de sua sala a trouxe de volta à realidade.

— Tem um minuto? — a voz de Lucas ecoou, e ela ergueu os olhos de seus papéis. Ele estava parado na entrada, com um olhar sério, mas não agressivo.

Ela assentiu, embora seu coração tenha acelerado sem motivo aparente. Ele entrou na sala e fechou a porta atrás de si, o que a deixou ligeiramente nervosa. Não era comum que tivessem conversas a portas fechadas.

— Estava pensando em algo... — ele começou, sem a costumeira arrogância. Ele puxou uma cadeira e se sentou em frente a ela, como se estivesse prestes a propor algo importante. — Sobre o projeto que estamos desenvolvendo juntos. Acho que poderíamos marcar uma reunião com o conselho da editora para apresentar uma prévia. Mostraria que estamos alinhados e prontos para algo maior.

Ela considerou a ideia. Fazia sentido, mas algo no modo como ele falava parecia... diferente. Não era apenas uma questão de trabalho. Era como se ele estivesse tentando criar um novo tipo de parceria. E isso a deixava inquieta.

— Acho que é uma boa ideia — ela respondeu, mantendo o tom profissional. — Podemos combinar os detalhes depois, mas concordo que seria um bom passo.

Ele sorriu, dessa vez sem nenhum vestígio de sarcasmo ou provocação. Um sorriso genuíno que a fez perceber o quanto isso era raro nele. Algo dentro dela se mexeu, e, por mais que tentasse negar, a tensão entre os dois agora não era apenas profissional.

O silêncio que se seguiu foi diferente de todos os outros. Não era o silêncio carregado de rivalidade, nem de confronto. Era algo novo, algo que ela não sabia como lidar.

— Sabe... — ele começou, quase hesitante, o que não combinava com a personalidade confiante que ela conhecia. — Eu nunca imaginei que trabalhar com você me faria questionar tanta coisa.

Ela franziu a testa, surpresa com a sinceridade do comentário.

— Questionar o quê? — perguntou, sem conseguir evitar o tom curioso.

— Minhas próprias crenças sobre o que é importante aqui dentro — ele respondeu, seu olhar se fixando no dela. — Eu sempre achei que ser o melhor era o que importava. Mas você me mostrou que é possível ser excelente de uma maneira diferente, sem precisar passar por cima de ninguém. É desconcertante.

Ela ficou em silêncio, sem saber exatamente como reagir. Ele estava abrindo uma parte de si que ela não esperava ver. Por um breve momento, ele não era mais seu rival. Ele era... humano. E vulnerável.

— Eu... não sei o que dizer — ela admitiu, baixando o olhar para os papéis em sua mesa. — Talvez a competição tenha feito com que a gente se esquecesse de que somos mais parecidos do que imaginávamos.

Ele se recostou na cadeira, observando-a com uma intensidade que ela sentiu quase fisicamente. A proximidade entre eles parecia maior do que apenas o espaço físico que os separava. E, pela primeira vez, ela não conseguia desviar o olhar.

— Talvez — ele disse, em voz baixa. — Talvez a gente tenha mais em comum do que só o trabalho.

As palavras pairaram no ar entre eles, carregadas de significados que ambos relutavam em explorar. E antes que qualquer um dos dois pudesse responder, um funcionário bateu na porta, interrompendo o momento.

— Desculpe, estão precisando de vocês na sala de reunião — o colega disse, alheio à tensão que tomava conta da sala.

Eles trocaram olhares rápidos, ambos cientes de que algo havia mudado. Levantaram-se ao mesmo tempo, ajustando suas posturas como se tentassem voltar à normalidade, mas o que acontecera entre eles não poderia ser ignorado.

Enquanto saíam da sala, Júlia se pegou pensando em como aquele simples gesto de vulnerabilidade havia mudado sua percepção dele. Talvez ele não fosse o inimigo que ela imaginava. E, no fundo, talvez ela também estivesse mudando mais do que queria admitir.

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