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Paradoxo: Capítulo 02

O barulho das teclas de computador e conversas abafadas preenchia o ambiente da editora Palavra Vivia naquela manhã. Júlia apertou o passo ao caminhar pelo corredor principal, tentando manter a mente focada no projeto que teria de discutir logo mais. A sala de reuniões estava logo à frente. Uma sala que ela normalmente considerava um campo de batalha onde seu intelecto e ideias sempre prevaleciam.

Mas, dessa vez, o campo de batalha teria outro general.

Ela respirou fundo antes de entrar. Ao abrir a porta, a visão do adversário imediatamente a irritou. Lucas já estava lá, relaxado em uma cadeira de couro preta, com os pés quase estendidos debaixo da mesa. Ele olhou para ela de canto de olho e um sorriso provocador surgiu nos lábios.

— Achei que você tivesse desistido da vaga — ele comentou, com uma voz leve, quase divertida.

Ela ignorou o tom dele e se sentou do lado oposto da mesa, ajeitando os papéis que trouxera. Pontualidade britânica, como sempre. Não o daria o prazer de uma resposta irritada.

— Se está tão preocupado com minha chegada, talvez devesse começar a trabalhar mais rápido. — Ela respondeu calmamente, forçando um sorriso profissional. — A competição será intensa, afinal.

Ele soltou uma risada curta. — Ah, eu adoro uma boa competição. — A expressão dele era de quem sabia que cada palavra dela alimentava seu prazer em provocá-la.

Antes que ela pudesse responder, a porta da sala se abriu novamente, e o Sr. Almeida entrou, com sua pasta de couro e um olhar cansado.

— Bom dia, equipe. — Ele os cumprimentou com um aceno, antes de se sentar na ponta da mesa. — Vamos falar sobre o projeto da antologia.

Os dois se endireitaram nas cadeiras, prontos para ouvir as diretrizes. Júlia sentiu uma onda de nervosismo, embora escondesse bem. Este seria o projeto que definiria sua carreira. Um passo em falso, e tudo o que havia construído poderia desmoronar.

— Esta antologia será uma peça-chave para o futuro da editora — começou o Sr. Almeida, com sua voz grave e autoritária. — Precisamos de uma curadoria impecável. O público está esperando algo extraordinário, e ambos estarão encarregados disso.

Ela se manteve atenta, com o corpo rígido e concentrado nas palavras dele. Já sabia que o projeto era importante, mas ouvi-lo reforçar aquilo colocava uma pressão ainda maior sobre seus ombros.

— Vocês vão trabalhar juntos em todos os aspectos: desde a seleção dos textos até a campanha de marketing. Quero que cada decisão seja discutida e que encontrem um meio-termo criativo. A reputação da editora depende disso, e também a de vocês.

O último comentário fez Lucas erguer uma sobrancelha, como se aquele desafio fosse algo que ele estava mais do que disposto a aceitar.

Júlia, no entanto, sentiu seu estômago revirar. Trabalhar com ele? Colaborar com alguém que ela mal conseguia suportar? Isso vai ser uma tortura, pensou consigo mesma.

— Alguma pergunta? — Almeida olhou de um para o outro.

Eles apenas balançaram a cabeça, concordando silenciosamente.

— Ótimo. Estou ansioso para ver o que vocês irão produzir. Lembrem-se, o sucesso da antologia pode ser o passaporte para o cargo de liderança.

Com isso, Almeida se levantou, deixando os dois sozinhos na sala de reuniões. O silêncio que ficou no ar era pesado, mas não desconfortável para ele, que parecia saborear o momento.

Lucas foi o primeiro a quebrar o silêncio.

— Então... Como vamos fazer isso? — Ele jogou a pergunta como quem não se preocupava realmente com a resposta, mas ela percebeu a astúcia por trás do tom leve.

Ela respirou fundo, ajustando-se na cadeira.

— Precisamos começar dividindo as tarefas. Eu posso cuidar da seleção dos textos e você do planejamento do marketing. — Sua voz era firme, prática, sem espaço para discussões.

Ele riu.

— É isso? Vamos nos dividir e fingir que estamos colaborando? — Ele balançou a cabeça, divertido. — Almeida não disse que a gente tem que decidir tudo em conjunto?

Ela sentiu um calor subir pelo pescoço. Era verdade, mas não queria admitir que ele tinha razão.

— Talvez você tenha outra ideia brilhante — ela retrucou, cruzando os braços.

— Sim, na verdade, tenho. — Ele se inclinou na cadeira, olhando diretamente para ela, os olhos afiados. — E que tal se começarmos com algo simples, tipo concordar que, gostando ou não, vamos ter que conversar. Muito.

Ela segurou o olhar dele, tentando não demonstrar a irritação crescente. Ele estava jogando com ela, desafiando-a a todo instante.

— Ok — ela respondeu finalmente, sem desviar os olhos. — Mas saiba que, se for para discutirmos, é melhor que você traga argumentos sólidos. Não tenho tempo para ideias vazias.

— Nunca tive — ele respondeu, levantando-se de repente. — Até amanhã, então. Podemos começar pelo catálogo de autores emergentes.

Ela ficou em silêncio, observando-o sair da sala com a mesma facilidade e confiança com que havia entrado.

Quando a porta se fechou atrás dele, Júlia voltou a respirar. Trabalhar com ele não seria nada fácil. Mas ela faria o possível para não ser intimidada ou superada.


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